A caminho de Ser... uma águia
Há muito se foram os dias do aconchego da mãe águia sentada sobre o que parecia ser um mero ovo que acabou por produzir-me a mim! O dia em que quebrei a superfície da casca morna que havia sido o meu lar, simplesmente porque deixara de haver espaço para mim lá dentro, foi uma descoberta incrível de "Ah! Há mais!"
Havia mais 2 como eu, mais a mamã e o papá que eram gigantescos! Invencíveis! E eu sabia que era naquilo que eu haveria de tornar-me, ainda que da minha perspetiva minúscula parecesse ser um grande feito vir a ser aquele pássaro tão grandioso, majestoso, a deslizar pelos céus infinitos.
O nosso ninho estava empoleirado tão alto que do nosso ponto de vista, a coisa mais próxima era mesmo o céu. Era céu e mais céu e depois, lá no fundo onde o horizonte se reúne, havia terra.
Bem, sabes, um dia, enquanto a mamã e o papá estavam por fora, a fazer o que quer que fosse que eles faziam e que resultava em trazerem-nos pedaços deliciosos de coisas boas para engolirmos, um dia fiquei mais aventureiro e cheguei-me centímetro a centímetro até à beira do ninho. Estava tão, mas tão curioso que tinha mesmo que saber que raio estava por debaixo da nossa casa!
Xiiiii! Apanhei um susto enorme! Estávamos tão alto que o chão lá em baixo parecia demasiado longe sequer para vislumbrar! Foi aí que me dei conta que a única forma de sairmos do nosso ninho seria, eventualmente, a voar! Dei-me um pequeno avanço, batendo as asas com tanta força quanta conseguia para ver se acontecia alguma coisa. Não. Ainda estava firmemente fixo no interior do ninho. Tentei uma e outra vez até que fiquei tão exaurido que colapsei e adormeci, frustrado. Sonhei com asas grandes e correntes de ar e até tive uma espécie de pesadelo quando as asas no meu sonho deixaram de funcionar! Mas felizmente a mãe e o pai estavam no seu caminho de regresso a casa e agarraram-me... no meu sonho, por isso fiquei seguro.
O meu irmão e a minha irmã não pareciam ter interesse nesta coisa de voar, pelo menos não tanto quanto eu. Para eles estava tudo bem como estava agora mesmo e não se maçavam em querer saber mais. Sabiam que as coisas seriam como teriam que ser e que o que tivesse que ocorrer ocorreria no seu próprio tempo.
Invejava-lhes a atitude e ainda assim não conseguia largar aquela minha expetativa. Não agora, depois de ter visto o que estava lá em baixo. Talvez eles estivessem assim descansados porque não se tinham acercado da beira do ninho. Só que agora que eu sabia, não podia obrigar-me a não saber.
Enfim. Os dias passavam e nós crescíamos. A mamã e o papá vinham e íam conforme lhes apetecia e traziam-nos delícias que recebíamos com regozijo cantado.
A nossa penugem transformou-se em penas e o espaço no nosso anteriormente enorme ninho passou a ser confinado.
O dia começa a raiar e a grande bola vermelha de calor começa a subir no céu mas a mamã e o papá não vão a lado nenhum. Hoje vão empurrar-nos para fora! Uhhhhhh! A mamã afasta-se a voar e depois volta, instigando-me a ficar empoleirado na berma do ninho até que a única coisa possível é perder o equilíbrio! E é o que acontece! E é aí que, conforme me vejo em queda descendente rumo ao chão recordo, "bate as asas! Bate as asas!" Fecho os olhos, respiro fundo e bato as minhas agora enormes asas. Uau! Espera aí! Afinal não se trata de fazer um esforço! Basta abrir bem as asas e deixar que a brisa as sustente. De repente mil luzes acendem-se dentro de mim e dou-me conta daquilo que sempre soube mas que não estava preparado para assumir até agora! É tão simples! Tão simples! "Estou a voar! Estou a voar!!!!!! Olhem para mim!!!! Iupiiiiii!" Nada mais importa. Agora apenas existe isto. Apenas este flutuar, este deslizar, este descobrir do que as minhas asas são capazes, descobrir como fundir-me com o céu, tornando-me Águia. Isto que sempre foi o que houvera de ser.
Recordo-me do meu pequeno eu a tentar acelerar desesperadamente o que não estava ainda maduro, a minha ânsia e a minha frustração, o meu esforço para atingir o que eu já era mas que não tinha paciência para permitir que se desenrolasse no seu próprio tempo. A minha curiosidade foi uma bênção e um martírio ao mesmo tempo. Mas no final, tudo funcionou porque não há forma de não nos tornarmos naquilo que já somos!!!
Texto por T. C. Aeelah
Sem comentários:
Enviar um comentário