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quinta-feira, 31 de março de 2022

A força da harmonia

 A força da harmonia



Nada. Absolutamente nada poderia ser mais relevante do que fazer as pazes com Deus. Pelo menos era isso que ela sentia agora. 


Tamara tinha chegado a esta conclusão enquanto imersa num turbilhão de consciência que se tornara aparente aquando da sua intrépida aproximação àquilo que sentia ser a sua Alma. Dançara para trás e para diante com este aproximar por largo tempo, ora chegando mais próximo, sentindo-se maravilhada, depois soterrada, depois envergonhada e não merecedora e depois bum, estava de volta ao início, ou pelo menos assim parecia. 


Por isso um belo dia ela decidiu simplesmente sentar-se dentro de si mesma e sentir toda a amplitude e magnitude desta dança, determinada a chegar ao fundo da questão. 


Respirou. Sentiu. Ficou. Largou os pensamentos. Entrou numa quietude profunda no seu âmago e depois mergulhou numa dor aguda que de repente se tornara evidente por detrás do seu coração, junto à omoplata direita. 


Ao mergulhar nessa dor, esta tornou-se ainda mais intensa. E ela continuou a respirar e a persistir. Até dar de caras com um guerreiro furioso e vingativo. Alto, corpulento e de armadura em punho. Um guerreiro não apenas zangado mas furioso. Parecia estar a lutar contra algo mas não havia nada ali. Estava apenas a lutar com o ar, à semelhança de D. Quixote nas suas batalhas com moinhos de vento. 


Tamara aproximou-se dele e ficou ali, de pé, olhando-o, à espera que ele a visse. O que acabou por ocorrer após um longo período, numa pausa para tomar fôlego. 

Olhou-o nos olhos, para que ele soubesse que ela o via. Foi algo inesperado para ele. Ele também olhou fundo nos olhos dela e houve qualquer coisa que o fez parar, dar um passo atrás e pousar a armadura. 


Conforme ela o sentia, pois ele era ela, sentiu uma grande angústia, uma tristeza arrebatadora e um desespero que nenhum do poder obtido através das suas vitórias podia anular. Ele perdera muitos entes queridos, populações inteiras, perdera tudo o que amava. E não conseguia compreender. Porquê? Se havia um Deus, porque é que estas coisas aconteciam? Porque é que havia tanto sofrimento? Porquê?

E assim ficara zangado com Deus. Não queria estar neste planeta. Não queria ser humano. Não aguentava mais. Tinha experimentado o papel de vilão e também os de vítima e de salvador mas nenhum deles lhe trazia consolo ou respostas. 


E de qualquer modo, se havia um Deus, quem é que poderia saber que partido tomaria nestas batalhas do destino? Consideraria os que vinham e queimavam as nossas aldeias como aqueles que mereciam a sua proteção ou considerar-nos-ía a nós que acabávamos por matá-los a eles? Quem seria merecedor da sua misericórdia? E quando era ao contrário? Qual seria o partido que Ele tomaria nessa ocasião? Havia sequer partidos a tomar? 


Tamara aproximou-se do guerreiro. Estendeu-lhe a sua mão. Ofereceu-lhe o seu abraço. Ele não conhecia nada disto. A sua luta era tão antiga que se esquecera por completo do que era a ternura, a gentileza, a doçura. O mundo era um lugar demasiado áspero para permitir-se tais vulnerabilidades. Mas ela estava aqui e sabia bem deixá-la abraçá-lo. Um enorme engasgo de emoção entupiu-lhe a garganta e depois saiu com um choro incontrolável. Um pranto que ele nunca tinha permitido antes. Gritou, gemeu, chorou tantas lágrimas que a ensoparam. E assim continuou até que as forças lhe faltaram e caiu de joelhos num acto de rendição. Ela ajoelhou-se com ele, mantendo os braços à sua volta. Apenas Presente. Compassivamente Presente. 


Ela conhecia todos estes sentimentos tão bem. E agora podia tomar responsabilidade por eles, reconhecê-los, abraçá-los e libertar toda a vergonha, toda a culpa, todo o julgamento. 


Podia libertar-se do ódio, finalmente, pois agora dava-se conta - ela tinha feito de tudo. Sido de tudo. E nunca tinha conseguido ultrapassar o vazio. O profundo vazio de jamais se sentir completa. 


Isto levara-o a ele, a ela, a jogar todo o tipo de jogos de poder, a ser o vitorioso, o salvador, a rainha e o rei, o psicopata, o senhor ou senhora da guerra, o mercenário, a enfermeira, o doutor, a escrava, o pobre e o decisor. E muito muito mais. Poder sobre os outros, sobre as coisas, sobre os lugares e sobre as situações e sentir-se sem poder. Ela tinha realmente experimentado de tudo. 


À medida que foi sentindo o seu Eu Maior, a sua Divina Essência, foi com surpresa que se deu conta que também tinha uma, tais eram as atrocidades que tinha experienciado e praticado ao longo dos eons de tempo que formavam a reunião da sua existência. Seja como um ele ou como uma ela, não importava a forma que assumira nem o lugar onde tinha vivido. Nada disso importava realmente. 


E agora ele tinha vindo ao encontro dela. Ela tinha conseguido ficar tão quieta, tão compassiva, que esta parte de si mesma que estivera zangada com Deus por muito muito tempo, finalmente tinha-se mostrado. 


E ela conseguia ver tudo. Claro que se o Deus em questão fosse aquele que a humanidade criou para servir o lado pelo qual foi criado, e se ainda assim Ele fosse amoroso e bondoso e todos os humanos fossem os Seus filhos - então este Deus não fazia sentido e não era de fiar. Se este era o Deus que tomava as decisões que definiam quem persiste e quem é destruído, não era um Deus que pudesse ser compreendido. Era demasiado oblíquo. Havia demasiada separação para que se pudesse sequer considerar ser esta a resposta. 


No entanto, na sua dança de aproximação, Humano e Alma, Alma e Humano, ela ficara ciente de algo diferente. Dera-se conta que era amada apesar de tudo e uma das suas descobertas mais relevantes fora que aqui na Terra é o Livre Arbítrio Humano que escolhe e a Alma não pode impedir a sua faceta Humana de encetar qualquer experiência que esta última escolha. Tal é a liberdade dada a esta faceta. O bem e o mal não são comandados por forças externas mas sim permitidas ou revogadas a partir de cada coração, de cada mente, de cada decisão. 


Em última instância, aos olhos da Alma, não há bem ou mal - existem experiências e os seus resultados. Existe um reino de experiências a ter enquanto em separação da nossa própria Alma e um reino de experiências a ter enquanto em reunião com Ela. Todas estas experiências expandem realidades, consciência e possibilidades, ainda que algumas sejam criadoras de sofrimento e outras de harmonia. 


Saber isto fora essencial para que ela pudesse escolher e decidir qual o caminho a tomar, o que permitia ser a sua experiência neste momento e o tipo de realidade que estava disponível para criar e viver. 


Já se fartara de estar no comando de tudo. Mesmo. O controlo estava a tornar-se um hábito demasiado exigente e para ela chegara o momento de dizer “basta”. Disponibilizara-se à rendição de descobrir um novo caminho com o leme da sua Essência, a sua própria partícula de Deus, mas mesmo nesta disponibilidade este propósito tinha sido evasivo. E agora sabia porquê. Era o guerreiro. Este guerreiro exausto, zangado e desesperado. 


Ficava feliz por agora poder permitir que estas emoções se movessem. Por poder convidar esta parte de si mesma para retornar a Casa. Quando ele estivesse preparado para confiar. Ela sabia esperar. A sua Alma mostrara-lhe a virtude da paciência e o seu coração estava mais e mais em paz cada dia, conforme ela explorava a avenida de Amor que a sua Essência ía construindo à sua frente, um passo de cada vez. 


Ela não tinha pressa. Não havia nenhum lugar onde precisava de chegar. Apenas experiências para ter. E ela escolhera fundir-se, Humano e Divino tornando-se Um todo com todas as suas partes como estrelas a brilhar no negro do céu noturno. Havia tanta beleza na escuridão deste céu e também no brilho da lua e das estrelas. Não podiam ser belos uns sem os outros. Mas tal como a lua parece desaparecer durante o dia e ao longo do seu ciclo mensal, também a sua Alma parecera não ter estado ali há uma enormidade de tempo. 


O seu amor por este planeta, por tudo o que nele habita, todas as criaturas, plantas, minerais, todos os humanos, crescia e crescia no seu tornar-se Um com a sua Essência. Era algo natural. Este amor. Este amor compassivo. 


Sentia honra por tudo, gratidão, respeito. Tantas jornadas, todas elas diferentes. Algumas sofredoras. Outras que não pareciam sofrer mas que ainda assim carregavam o pesar dentro de si. E depois uns poucos que se tinham dado conta de serem Deus também, encetando uma nova forma de realidade onde o sofrimento deixara de ser o denominador comum. 


Sim. Ela via os dramas. Claro que os via. Não estava a fazer de conta que não era humana. O que não conseguia fazer era identificar-se com eles e deixar-se emaranhar neles. Ela sabia que ficar Presente no seu saber interno de Deus em si podia despoletar tsunamis de consciência ao redor de todo o planeta de uma forma que nenhuma luta, não importa quão grande, poderia conseguir. Sabia-o completamente. 


Não tinha interesse em tomar partidos pois sabia quão preciosa a compaixão era e tinha sido para ela própria. No seu longo e desafiante destapar de todas as camadas escondidas de não aceitação, apenas a pura compaixão da sua Alma tinha sido capaz de mantê-la suficientemente segura para que não tivesse medo de enfrentar o que viesse ao seu encontro, sem julgamento, sem rejeição ou negação. Tivera que tornar-se neutra, sentindo as emoções, as crenças, as experiências da sua existência sem ter que consertá-las ou mudá-las. Não podia mudá-las. Já não estavam aqui. Faziam parte do seu passado. Mas podia aceitá-las e convidá-las de volta a Casa, dentro de si mesma, a criadora de cada uma. Dissolvendo.

Transformando. Deixando ir. Escolhendo agora de forma diferente. Agindo de forma diferente. Sendo diferente. A sua Alma mostrara-lhe como ficar em quietude e abertura. Recetiva a cada parte sua não amada. E isto mudara tudo. Aqui. Agora. 


Tamara sabia quão poderosa é a compaixão. Quão incrivelmente poderoso é o seu próprio brilho. Sabia-o tão fortemente que não importava quem mais sabia disto, o que os outros achavam ou o que faziam. Com o seu guerreiro agora em Casa, ela podia usar essa força, essa coragem, para respirar amor imparcial pelo mundo fora, cada dia e a cada momento, firme, determinada, ilesa pelas tempestades que rugiam ao seu redor. Sentia-se como um bastão firmemente preso ao chão, sendo compaixão. Deixando-se ir no seu regaço mais e mais. Deixando o espaço livre ao libertar séculos de cinismo, apego a opiniões e pontos de vista preconceituosos. 


Agora que o guerreiro se fundira com ela, o seu coração estava suficientemente forte para que ela pudesse fundir-se na sua Alma e encontrar-se do outro lado da identidade. Para um novo capítulo. Um novo Livro. Uma nova Terra. Quem sabe para muitos. Mas ainda assim sem qualquer expetativa de resultados. Sabia que podia escolher apenas para si mesma. Escolher pelos outros era uma ilusão e ela preferia usar a energia que empenharia nessas tentativas vãs para neste caso estar ao serviço através do seu exemplo de harmonia e pelo brilho que essa experiência emanava por si só. 


Não era uma escolha comum. Mas era a escolha que ela fizera. O convite da sua Alma. Um convite que ela aceitara completamente.


Poder experienciar um amor tão grande que nenhum medo poderia negar - era este o seu desígnio último, a mãe de todas as escolhas para a sua senda. 


O amor com a sua Alma era isto mesmo. Tinha enfim descoberto esta verdade em si e viver este amor era a completude plena. Viesse o que viesse. Nada mais importava. 


E assim é a força que prescinde do poder - a força da harmonia intrínseca.  



Foto por Casey Horner - Unsplash
Texto por T. C. Aeelah 


quarta-feira, 2 de março de 2022

Ser isso mesmo

 

Ser isso Mesmo

Tornara-se um homem, o Miguel, um jovem homem. Olhando-se ao espelho, Miguel mirava o seu rosto de 28 anos enquanto ponderava sobre como chegara até aqui, como era estar aqui e o que estaria diante dele daqui para a frente. 

Tratava-se de um momento mais ou menos indefinido, em que ele se sentia preenchido, desapegado de qualquer identidade em particular e ainda assim continuava a acreditar que faltava algo para que ele pudesse realmente assumir que todas as suas atribulações e aflições do passado já lá íam e que agora estava a entrar num mundo completamente novo onde nada do que ele conhecera seria igual. Que nada jamais seria igual. 

O vasto desconhecido do novo agora. A sua pele estava radiante e saudável e nos seus olhos havia uma vivacidade, um brilho que tinha vindo a crescer ultimamente. Sentia-se muito mais velho que os seus parcos anos e ao mesmo tempo sentia-se como uma criança inocente pronta para brincar para sempre. Mas as brincadeiras que agora se via pronto a encetar, eram de uma natureza diferente das que lhe tinham aguçado a vontade até agora. E era neste preciso ponto que ele tinha tendência para ficar atascado. Havia algo sedutor no ficar com o que era conhecido. Alguma coisa que o agarrava e o trazia de volta para os círculos contínuos de sentir-se menos que o suficiente, não merecedor ou eventualmente não preparado para ser soberano, como o sábio Mestre que costumava visitar periodicamente. Aquele que vivia a alguns quarteirões dali, numa pequena casa com um aconchegado jardim, sem preocupações ou problemas, apenas desfrutando de cada dia com um belo sorriso sabedor plantado no seu rosto a toda a hora. Quase que lhe invejava esta capacidade de ficar nesse estado fluido de simplicidade. Era o que Miguel queria. Queria isso mais do que qualquer outra coisa. Mas parecia que ainda assim não estava pronto. 

Por isso decidiu visitá-lo. Talvez ele tivesse alguma coisa para lhe dizer que o ajudasse a alterar este padrão repetitivo em que sempre voltava a cair. 

 

***

E lá estava ele, sentado no seu alpendre, a bebericar uma chávena de chá, enquanto ouvia a canção da natureza junto com o zumbido da cidade que ficava do outro lado do seu jardim. Respirando… e sorrindo. 

Apercebeu-se que eu estava um pouco agitado e perguntou “então meu amigo, como tens estado?”

“Bem. Acho eu. Tenho esta estranha sensação de que tudo está bem, bem demais, quase. E depois entro numa espiral de não confiar em mim mesmo para poder estar assim tão bem e encontro sempre uma forma de provar que há algo de errado comigo.”

“Hmmmm”. Disse ele. Sorvendo silenciosamente o seu chá antes de pousar a chávena numa pequena mesa que se encontrava ao lado da sua confortável cadeira.

“Gostarias de fazer uma experiência?” Perguntou-me ele. 

“Bem, se isso tornar as coisas mais claras para mim, sim, claro.” Respondi humildemente.

“Todos os dias, experimenta esta rotina de andar às voltas durante algum tempo. Pode ser na tua sala ou lá fora em qualquer lugar. Os círculos podem ser mais estreitos ou mais largos e podem ser quantos quiseres. Tenta simplesmente andar às voltas por um pedaço de tempo, todos os dias. Círculos completos. E vê o que isso te traz.”

Olhei para ele, um pouco perplexo, sem compreender realmente qual seria a utilidade daquilo, mas uma vez que ele era definitivamente um Mestre e eu confiava tanto nele, aceitei o desafio.

***

O Miguel agradeceu a Tobias e despediu-se, ainda não inteiramente convencido acerca desta pequena experiência.

Começou naquele mesmo dia, durante um passeio no parque, dando algumas voltas ao lago e tentando ficar atento ao que sentia. 

Cada dia repetia este exercício de andar às voltas, por vezes em casa, e outras na rua, umas vezes fazia círculos mais largos e outras mais estreitos. E começou a notar algumas coisas. A familiaridade parecia reconfortante. Ainda que fosse uma coisa vazia em si mesma, sabia bem ter a noção que acabaria onde começara uma e outra vez e era bom saber onde colocar os pés e como seria o caminho. Era estranhamente hipnótico e enquanto andava obedientemente às voltas nestes círculos repetitivos, a sua mente tinha rédea solta para criar todo o tipo de pensamentos, falando a bandeiras despregadas, como se quisesse fazer-lhe companhia no seio desta trajetória aparentemente aborrecida e repetitiva. 

O conforto pedia desconforto, tornando-se mais sedutor criar algum tipo de evento que lhe incendiasse a adrenalina, algures no seu circular ou noutro qualquer momento do dia, só para apagar aquela sensação de mesmice. 

Começou a ver séries dramáticas e a andar pela cidade no sentido de encontrar algum tipo de excitação que quebrasse a torpor de sentir-se embrutecido por fazer a mesma coisa todos os dias. 

Começou a sentir-se tolo e estranho e ansioso. Mas não eram as voltas propriamente ditas. Elas não eram nada em si mesmas. Eram apenas círculos. Nada para descobrir. Era ele. Como ele se sentia dentro de si mesmo. Por um lado confortável e de certa forma seguro, mas por outro querendo mais do que apenas isto e duvidando ser capaz de se tornar algo mais do que ele achava não ser grande coisa. 

Deu-se conta que esperava qualquer coisa. Nem sabia o quê. Algo que tinha que ser melhor, ou ele próprio que deveria ser mais merecedor, mais válido talvez. Mais grandioso… seria? Algo que poderia qualificar de mágico. Mas isto levantou a questão: o que é mágico, então?

Foi ter com o Mestre e partilhou o que sentia. 

***

“Não consigo perceber o que falta.”

“E se não faltar nada? E se decidires sair das voltas a meio caminho? Ou se entrares para o meio do círculo? Ainda precisarias de regressar para completá-las? Acharias que há alguma imperfeição com o não completar de um círculo sempre e todas as vezes?”

“Não sei. Não tenho a certeza de quem sou ou de quem devo ser e o que vou encontrar se começar a quebrar os círculos a meio e nunca mais voltar para os completar. Não sei como vai ser a vida sem que me sinta inseguro dos meus passos, sem o conforto dos círculos e a necessidade de criar desconforto por causa deles. Até mesmo ir para o centro do círculo e ficar lá… Hmmmm, apenas ali. Se me tornar seguro e confiante, firme na minha sabedoria e me render por completo à minha inteireza, não vou estar preso, e isso parece assustador neste momento. Parece demasiado vasto… demasiado grandioso… Ah!!! Se calhar é desta grandiosidade que estou à espera?! É isso que tenho medo de permitir!”

“Talvez seja. Porque é que não vais experimentar por algum tempo para veres como sentes estas experiências fora dos círculos habituais?”

“Sabes, olho para ti e pareces tão pleno. E no entanto a tua vida é absolutamente simples. E eu gosto disso. Gosto do que vejo em ti e adoro estar na tua Presença, mas não tenho a certeza se isto chega para mim…”

“A pergunta é, na verdade, se tu és o suficiente para ti?”

***

Com um sorriso, o Miguel olhou Tobias nos olhos, com os seus marejados de lágrimas e eis que percebeu, no fundo do seu coração, como uma tocha a incendiar a chama olímpica. Ele era isso mesmo. Agora. 

 

Texto por T. C. Aeelah

Foto por Agnese Lunecka - Pexels




terça-feira, 1 de março de 2022

Being it

 Being it

Michael was a young man by now. As he looked at himself in the mirror, studying his 28 year-old face, he was musing about how he had got here, what it felt like and what lay ahead of him.

He was in a kind of an undefined moment, where he felt fulfilled, unattached to any particular identity and yet he still believed there was something missing for him to really assume he was past all of his prior human afflictions and really stepping into a whole new world where none of what he had known so far would be quite the same, ever.

The vast unknown of the new now. His skin was bright and healthy and his eyes had a liveliness to them, a sparkle that had been growing lately. He felt much older than his years and at the same time like an innocent child ready to play forever. But the games he was ready to play were of a different nature to the ones he had been playing so far. And this is where he tended to get stuck. There was something enticing about staying with what was known. Something that grabbed him and kept on bringing him back into the circles of feeling less than enough, unworthy or somehow not ready to be sovereign like the wise Master he used to visit every so often. The one that lived a few blocks away in a small house with a quaint garden, with no worries or concerns, just enjoying each day with that beautiful smile of knowingness planted on his face all the time. He almost envied him for being able to stay in such an ease and flow of simplicity. That’s what he wanted. He wanted it more than anything else. But still he seemed not to be ready.

So he decided to go and visit him. See if he had anything to say that could help him change this repetitive pattern which he always got himself back into.

***

Sure enough there he was, sitting on his porch, sipping a cup of tea, listening to the song of nature coupled with the buzz of the city beyond his garden, breathing… and smiling.

He saw I was a little bit troubled and asked “so my friend, how have you been?”

“Fine, I guess. There is this strange feeling that all is well, almost too well and then I get myself into not trusting myself to be so well and somehow find a way to prove there is something wrong with me.”

“Hmmmm”. He said. Quietly sipping his tea and then putting his cup down on the small table beside his comfortable chair.

“Would you like to make an experiment?” He asked me. 

“Well, if it’s going to make things clearer for me, of course.” I humbly replied.

“Every day, try this routine of going around in circles for a while. Could be in your living room or outside somewhere. The circles can be smaller or wider and they can be whichever number you choose. Just try going around in circles for a while, every day. Complete circles. And see what that brings you.”

I looked at him, a little bit perplexed, not really understanding what use that would have, but since he was definitely a Master and I trusted him so much, I accepted the challenge.

*** 

Michael thanked Tobias and left, still not entirely convinced about the use of this little experiment.

He started that very day, during a walk in the park, where he went around the large pond a few times. Trying to pay attention to what he felt. 

Each day he repeated this exercise of going around in circles, sometimes at home, sometimes outside, sometimes wider circles, sometimes smaller. And he started noticing a few things. The familiarity felt somehow comforting. Though it was an empty thing in itself, it felt good to know that he would end up where he started each and every time and that he knew where to step and knew what the path looked like too. It was strangely hypnotic and while he was obediently going around in these repetitive circles, his mind had free rein to create all sorts of thoughts, incessantly rambling away, as if to keep him company within the seeming boredom of taking the same trajectory over and over again. 

The comfort beckoned for discomfort so it became more seductive to create some sort of more adrenaline driven event somewhere amidst the circles or some other time of the day, just to wash away that feeling of sameness.

So he got himself into watching drama filled series and going around town to find some sort of exciting event that would disrupt the numbness of feeling dumbed down by doing the same thing every day.

He started feeling silly and strange and anxious. But it wasn’t the circles themselves. They had nothing in them. They were just simply circles. Nothing to discover. It was him. How he felt inside. On one hand comfortable and somewhat safe, but on the other wanting more than just that and doubting himself to be able to be more than what he perceived to be nothing much.

He realized he was expecting something. He didn’t even know what. Something that had to be better, or more worthy somehow. More grandiose maybe. Something that he might qualify as magical. But this got him questioning: what was magical after all?

He went to the Master and shared what he had been feeling.

 

***

“I just can’t figure out what is missing.”

“What if nothing is missing? What if you decide to start stepping out of the circles midway? Or right into the middle? Would you still need to come back to them and complete them? Would you feel there was some sort of imperfection with not completing a whole circle each time?”

“I don’t know. I am not sure who I am or who I am supposed to be and what I will find if I do start breaking the circles mid-way and never coming back to complete them. I am not sure what life will be like without feeling unsure of myself and my steps, without the comfort of the circles and the need to create discomfort because of them. Even stepping into the centre of the circle and staying there… Hmmmm, just there. If I become sure, firm in my knowingness and really surrender to being whole, I won’t be stuck anymore and that seems scary right now. It seems too vast, too grand… Oh!!!! Maybe this is the grandness I am expecting then?! This that I am afraid of allowing!”

“Maybe it is. Why don’t you go out and try it for a while and see how these experiences out of your usual circles feel.”

“You know, I look at you and you seem so content. And yet your life is so absolutely simple. And I like it. I like what I see in you and I love being in your Presence but somehow I am not sure if this is enough for me…”

“The question is, really: are you enough for you?”

***

With a smile, Michael looked into Tobias’s eyes, tears flooding his own, and he understood, deep in his heart, like a torch lighting the olympic flame. He was it. Now.

 

Text by T. C. Aeelah

Photo by Alesia Kozik - Pexels